quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Empregabilidade em filosofia


Vitor Guerreiro no blog da Crítica chamou a atenção para um interessante artigo que mostra o crescente mercado de emprego para licenciados em filosofia no mundo anglófilo. O que o artigo diz não é nada de novo. Resumidamente refere que a licenciatura em filosofia habilita os estudantes de capacidades analíticas e críticas que são muito aproveitáveis no mundo dos negócios. Ora bem, isto soa estranho no nosso país por duas razões especiais:
1) Porque existe o preconceito generalizado de que a filosofia não serve para ganhar dinheiro. Aliás, um dos clichés de muitos licenciados em filosofia é que foram para o curso por pura vocação e não para ter um emprego (cliché usado por muitos que fazem da filosofia o seu primeiro sustento). A vocação é sem dúvida importante e nem toda a gente tem vocação filosófica. Mas não há problema algum em fazer da filosofia uma fonte de rendimentos. Eu faço ao ensinar filosofia e estimo a minha profissão precisamente porque me pagam para estudar e ensinar o que mais gosto, filosofia.
2) A. Porque os cursos de filosofia em Portugal pura e simplesmente não desenvolvem qualquer capacidade crítica nos estudantes. O que desenvolvem é admiração cega pelos pavões. Por muito desagradável que possa ser, a realidade é esta. Na maior parte das disciplinas dos cursos de filosofia, o estudante limita-se a seguir a tese do mestre, sem qualquer possibilidade de a discutir.
B. as teses dos mestres dos cursos de licenciatura em filosofia em Portugal não são também, na maioria das vezes, sequer, teses que se discutam porque não obedecem a qualquer estrutura do discurso argumentativo.
Por estas razões que aqui toscamente abrevio, quando falamos de filosofia não estamos a falar do mesmo se nos referirmos a Portugal e aos Estados Unidos, por exemplo. Aliás, o artigo refere a importância do estudo da lógica formal. Ora o estudo da lógica nos cursos em Portugal aparece como uma disciplina isolada que não tem qualquer aplicabilidade nas restantes disciplinas. E não tem pois os outros mestres nem sequer sabem lógica, desprezando-a.
Finalmente uma observação: já por diversas vezes referi que não interessa se os mestres da filosofia em Portugal fazem ou não estudos singulares e bons. Sobre isso nada tenho a dizer. O que coloco em causa é que os estudantes não foram estudar filosofia para se tornarem admiradores dos mestres, logo, não tem que levar com as suas teses mais sofisticadas. Tem de ter a base e é essa base que os mestres deviam ensinar, dotando os estudantes das capacidades básicas para poderem eles também, um dia produzir as suas teses. Muitas vezes ouço profissionais da filosofia queixarem-se que o mundo de hoje não está preparado para compreender a filosofia. Não alinho neste discurso e ele é até falso, já que nunca como nos nossos dias existiram tantos cursos de filosofia e tantos filósofos, de resto, exactamente o mesmo que se passa com a ciência. Agora é possível que a imagem pública da filosofia em Portugal ande bastante por baixo. Mas isso não se deve a que as pessoas não liguem à filosofia. É que a filosofia que se pratica nos nossos cursos não desperta qualquer interesse para a maioria das pessoas e assim não é de estranhar que os cursos fechem e que a filosofia do 12º ano tenha tido uma morte sem ninguém se dar conta, nem mesmo os mestres da universidade, que desprezaram tanto o secundário, mas que sempre viveram na sombra dele. A seu tempo regressarei a estes temas.
A imagem é do performer Stelarc
 Texto original aqui

1 comentários:

Sergio Nascimento disse...

muito significativa. é de suma importancia que para a formação de pensadores, que os professores de filosofia conduzam os alunos a compreender a filosofia, a luz da sua realidade.

Postar um comentário